Belting: uma visão otorrinolaringológica de Luís Henrique Chechinato Costa e André de Campos Duprat.
O belting é um padrão musical caracterizado pela qualidade da sua projeção, clara e de alta energia. |
INTRODUÇÃO
O belting é um padrão musical caracterizado pela qualidade
da sua projeção, clara e de alta energia. Podemos observar traços
do belting em diferentes estilos: muitas das músicas étnicas ao redor
do mundo, spirituals, blues, rock, gospel, jazz, teatro musical e mesmo no samba.
Mas é no teatro musical onde o estilo foi realmente consagrado
e ganhou algumas características próprias, fruto da demanda dos musicais,
tornando-se popular em diferentes partes do mundo.
No Brasil, com o aumento dos musicais, a procura por
professores de canto especializados no assunto cresceu muito,
despertando o interesse de fonoaudiólogos e otorrinolaringologistas que
começaram a atender este grupo de cantores, com diversas queixas relacionadas
à exigência que a técnica impõe às estruturas do aparelho fonador, agravadas
pela demanda do número de apresentações semanais.
É de conhecimento geral que a música não clássica surgiu como extensão
da fala, na qual há um domínio maior do registro de peito. Se assumirmos que os escravos cantavam sons, provavelmente de sua terra natal, em campo aberto, e a qualidade vocal deveria ser tal que fosse ouvida a uma determinada distância
teríamos a origem mais provável do belting1.
O primeiro nome descritivo foi o termo coon-shouting ou em
português algo como grito do guaxinim. Nos anos 20 por não existir
amplificação adequada, era necessário que o canto fosse forte o bastante
para encher o teatro, houve então uma popularização desta técnica de canto1.
No dicionário Cambrige um dos significados do termo BELT é Hit Hard
ou bater forte com violência, que é o que o cantor faz durante o canto
com a técnica de belting, onde a laringe é submetida a uma grande pressão
subglótica. Como o termo se adequava bem à forma do canto, pegou
e acabou ficando1.
Esta técnica de canto produz um som de alta energia. Mesmo no canto lírico,
alguns tenores utilizam esta técnica na emissão de notas altas2. A sonoridade
por ser muito forte, é pouco tolerada em locais pequenos, ficando restrita sua utilização em grandes teatros.
O Belting é uma técnica descrita como uma extensão do registro de peito,
a agudização é atingida às custas de ajustes do trato vocal e da laringe sem utilizar a mudança de registro. Não é sobre fazer tons bonitos, a qualidade do som produzido é forte, metálica e algumas vezes anasalada. Soa como grito, porém modelado pela organização de suas frequências e pelo seu andamento em forma de música.
Um belting eficaz significa usar um fluxo consistente de ar, ressonância
e uma forte voz falada que sustente os sons cantados. Se o fluxo de ar não
for rápido o suficiente, o som pode parecer espremido ou tenso.
posição da língua é alta e larga. O som metálico é obtido pela constrição
do esfíncter ariepiglótico e o encurtamento do trato vocal, o que resulta em uma supraglote mais estreita.
Possivelmente a diferença do belting e outros tipos de canto reside
nas forças longitudinais sobre a laringe. Em teoria quanto mais longo o tubo mais escuro é o som, e quanto mais curto o tubo mais claro é o som4. O Som claro
do belting seria devido a contração dos músculos infrahi-óideos,
usados para estabilizar a cartilagem tireóidea em posição vertical e
permitir que a cartilagem cricóidea incline dorso-cranialmente.
Há um predominínio do funcionamento do músculo
tireoariten óideo, as pregas vocais ganham massa aumentando o ciclo fechado da fonação em quase 70% e conseqüente aumento da pressão subglótica2.
As características acústicas e fonatórias dos estilos de canto dependem
da fonte sonora e da frequência característica dos formantes. São controladas pela pressão subglótica, ajustes laríngeos e formato da faringe4.
Quando a laringe é elevada e a faringe estreitada, o resultado acústico é o aumento das frequências de todas os formantes6. Na voz de belting o primeiro formante
é elevado a frequência do segundo harmônico, somando as ondas e aumentando a intensidade3.
Em ordem para evitar a sobrecarga das pregas vocais, a parte da boca do trato vocal deve ser gradualmente alargada conforme o pitch aumenta.
É importante enfatizar que o belting não é puramente voz de peito.
A voz de peito é vista com a laringe baixa, faringe ampla, posição alongada da boca, e vibração de peito harmoniosa4.
No exame endoscópico é visto somente a região posterior das
aritenóideas e a região superior da cricóidea, as pregas vocais estão
completamente escondidas. A aparência disto é devida a cartilagem
cricóidea inclinar anteriormente3.
Para mulher o belting é mais uma voz mista, peito e médio, que só peito.
A sensação não deve ser de tensão, mas o som pode ser intenso devido ao aumento das vibrações ao redor da face pela ressonância nasal. Quando está correto
os cantores de belting dizem que a sensação é como de registro médio, mas soa como peito5.
Para os homens é mais simples, para criar um som de belting deve-se procurar
um som com ressonância anterior e tom cheio, este tom pode ser atingido com o aumento da ressonância nasal.
A ressonância nasal é um excelente caminho para agudizar sem levar
o registro para a cabeça, a voz é tirada da máscara. Esta seria outra diferenças
do lírico. O problema é que a ressonância nasal tira a projeção, que precisa ser compensada com a abertura da boca5.
Todos os ressonadores são usados para o canto, mas para o belting
o ressonador proeminente é a cavidade nasal. Quando o som muda
para ressonância posterior é chamado cobertura, isto é, usa mais ressonância posterior.
A voz com ressonância nasal é mais leve para o agudo. O misto de ressonância posterior com nariz suaviza os efeitos caricatos da ressonância puramente nasal, dando um som mais agradável para a voz5.
É postulado que o belting utiliza o uso o modo de fala da laringe com
ambos o pitch e o loudness aumentados e nos extremos de esforço. As doenças encontradas nestes profissionais são pouco diferentes das vistas em indivíduos não profissionais, que apresentam hiperfunção vocal no seu comportamento vocal3 .
O belting é controverso entre cantores e professores de canto, pois se
tem a idéia que é uma técnica que pode arruinar a voz, mas na verdade qualquer tipo de técnica mal feita pode arruinar a voz , incluindo uma técnica ruim para o belting. Quando bem feito o resultado é um som claro e forte, o bastante não somente para ouvir, mas para sentir e nunca mais esquecer.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1- Robert T. Sataloff, M.D., D.M.A., F.A.C.S.-
comunicação pessoal, 2006.
2- Estill, J " Belting and classic voice quality:
some physiological differences". In Medical problems of performing artists, Hanley & Belfus, Philadelphia, 1998,3(1): 36-43
3- Lawrence, V "Laryngological observations on belting"
J. Res in Singing 1969;2; 26-8.
4- Sundberg J, Grammming P, Lovetri J "
Comparisons of pharynx, source, formant and pressure
characteristics in operatic and musical theatre singing" J Voice, 1993;6(4): 301-10.
5- Philips, P S "Singing for dummies". Wiley Publishing, New York, 2003.
6- Titze, I. R. "Principle of voice production".
National Center for voice and speech, Iowa City, 2000.
1) Mestre - doutorando pelo departamento de
otorrinolaringologia da Faculdade de Ciências Médicas
da Santa Casa de São Paulo Professor auxiliar ORL FMJ